sábado, 20 de abril de 2013

Bento XVI, eleito há oito anos (2005-2013)


 
Fez ontem, dia 19 de Abril, oito anos que o Cardeal Joseph Ratzinger foi eleito Papa, tomando o nome de Bento XVI.

Confesso que, a inicio, foi daqueles que tinha uma certa opinião negativa a seu respeito, um pouco por influencia da imagem que a Comunicação social  foi criando à sua volta, durante o pontificado do seu antecessor João Paulo II: a do “Panzer -Cardeal”, a do “Grande Inquisidor”, o ortodoxo da linha dura e perseguidor do teólogos dissidentes, uma espécie de nostálgico do Pré-Vaticano II -  ele que anos 60, fez parte da plêiade de teólogos ”liberais” do mesmo Concilio como assessor (do cardeal Friggs, arcebispo de Colónia) mas que se teria “deslocado para o conservadorismo”, assutado com a crise pós-conciliar e com as revoltas do Maio de 1968.

Mas tenho que admitir que mudei de opinião a seu respeito, ao longo do seu (afinal) breve pontificado de oito anos. Bento XVI foi um Papa de enorme estatura intelectual, tal como foi durante a sua vida como teólogo, padre, arcebispo e cardeal. As suas encíclicas (sobretudo “Deus Caritas Est”) e os seus livros (quer os que escreveu como teólogo – a fabulosa “Introdução ao Cristianismo”- quer como Papa -  a trilogia “Jesus de Nazaré”) ficarão na História da Igreja e mesmo da Cultura. Também a compilação das suas “catequeses” das audiências de quarta-feira são notabilíssimas, pois conseguiu falar de temas teológicos e de santos em linguagem simples e acessível ao comum dos fieis.

Recebeu homenagens de intelectuais laicos, como o filósofo alemão Jurgen Habermas e o escritor peruano Mário Vargas Llosa. Relançou as pontes entre a Fé católica e o mundo da cultura, através da criação do “Pátio dos gentios”; prosseguiu o estilo “missionário” de João Paulo II, com as sua viagens ao longo do Mundo; procurou restaurar a dignidade da Liturgia católica, rectificando alguns aspectos e abusos; reabilitou a Missa Tridentina cheia de beleza e hieratismo; tentou (em vão) a reintegração dos tradicionalistas da Fraternidade de S. Pio X na Igreja. E perante o revelar dos escândalos de pedofilia e pederastia dalguns membros do clero católico, pediu publicamente perdão às vítimas, encontrou-se com elas nas suas viagens, e promulgou normas severas para que tais abusos não se voltassem a repetir, manchando quer a dignidade das crianças e adolescentes, que o rosto da Igreja, em que se deve sempre reflectir a Beleza de espiritual de Cristo.

Mas este Papa idoso, tímido, inteligentíssimo, de voz suave e sem grande carisma junto das multidões (ao contrario do seu antecessor, «o Papa mais popular de sempre», espécie de estrela «pop») teve que defrontar o longo dos seus oito anos de pontificado, uma oposição surda, tenaz, quer vindo de sectores laicistas radicais das nossas Sociedades “pós-cristãs”, quer mesmo de sectores do interior da sua própria Igreja - aqueles que nunca lhe perdoaram a suposta viragem para posições conservadoras (“foram eles que mudaram, não eu”, disse uma vez) e condenação dos desvios dalguns teólogos.

Foi acusado tenazmente de encobridor de padres pedófilos, quando foi dos primeiros  a denunciar esse mal  e a combatê-lo; as suas afirmações sobre a forma mais eficaz de combater a epidemia da sida foram deturpadas (“uma sexualidade humanizada”: fidelidade conjugal, abstinência pré-matrimonial, etc.), provocando a ira da opinião publica contra ele e contra a Igreja ao ponto de acusar o Papa pelo alastramento da sida em África; o levantamento das excomunhões aos Bispos “integristas”, seguidores do cisma do Arcebispo Lefebvre levou à revelação de que um destes seria  “negacionista” do Holocausto e que o Papa se prepararia para readmitir na Igreja elementos “fascistas e anti-semitas” - o que provocou mais uma avalanche de “protestos”, tendo o Papa acabado por escrever uma carta aos Bispos do mundo inteiro, acusando-os quase de o terem abandonado nesta situação e de não ter sido convenientemente informado.  E todos recordarão ainda o famoso episodio de um seu discurso em 2006, a quando da sua visita à Alemanha, em que uma citação de um Imperador bizantino do século XIV sobre o Islão e seu profeta Maomé levou, em alguns países muçulmanos, a uma fúria anti-Papa, em que alguns cristãos forma inclusive mortos.

Mas penso que o mais doloroso para o ex-Pontífice terá sido o famoso caso da fuga de documentos pessoais, feita pelo seu próprio mordomo (a “Vatileaks”), bem como a relatório que depois encomendou a três cardeais da sua inteira confiança e que nunca foi tornado público sobre esse escândalo e outros (as intrigas da Cúria romana, Banco do Vaticano, comportamento sexual dalguns membros do clero, etc.) . Bento XVI ter-se-á provavelmente sentido traído pelos seus mais directos colaboradores (não sabemos até que ponto) e, sentindo-se velho, cansado e sem forças, preferiu abdicar da chefia da Igreja (algo inédito desde o século XV), deixando ao seu sucessor a tarefa (gigantesca) de “pôr a casa em ordem”.

Como católico, rezo pelo Papa-emérito, Bento XVI  e pelo presente Papa, Francisco I; mas não posso, pessoalmente, de sentir um sentimento de tristeza pelo facto do anterior Pontífice (“um dos Papas mais cultos e inteligentes que a Igreja teve em séculos”, como disse o escritor agnóstico Vargas Llosa) ter recebido tanta incompreensão, hostilidade, ódio, e rejeição durante o seu pontificado, que foi, um martírio silencioso e incruento. Um pouco como no dístico que lhe atribuído na (provavelmente apócrifa) “Profecia dos Papas”, atribuída ao bispo irlandês  S. Malaquias: “Glória da Oliveira”. Ora foi no Jardim das Oliveiras, que Jesus iniciou a sua paixão, depois da Última Ceia. O pontificado de Bento XVI foi um silencioso e incruento martírio. Hoje, no retiro do mosteiro “Mater Ecclesiae”, à semelhança do seu longínquo antecessor S. Celestino V - o Papa do século XIII que também abdicou – Jospeh Ratzinger, como já alguém disse,  “depois de ter falado de Deus a nós, fala de nós a Deus”.

Que Deus dê a Sua bênção,  a ele e a nós.

 


 

Sem comentários:

Enviar um comentário